
Odeio final de ano. Por que, me perguntariam aqueles que adoram as festividades do período. Questão simples de se responder. Creio ser esta uma época aonde a hipocrisia – já tão habitual no nosso cotidiano – ganha dimensões exorbitantes. Espírito cristão é possível argumentar. Falsidade cristã, talvez...
Na verdade o parágrafo anterior não tem nada a ver com o que pretendo escrever hoje. Não passa, aliás, de mero “nariz de cera” como se diz no jargão jornalístico, portanto desnecessário e irrelevante por não acrescentar nada ao leitor. Pronto, não é que este também se tornou mais um narigão de cera?!
Pois bem, para poupá-los de minhas viciosidades narrativas passo direto para o meu objeto: a cantora e interprete lírica de nome Jessye Norman. Lembro-me perfeitamente da primeira vez que a vi e ouvi. Na ocasião a soprano acompanhada pela Metropolitan Opera interpretava os Spirituals (canções de igreja pentecostais negras, uma das raízes pode-se dizer do que viria a ser a atual Black Music) juntamente com outra grande cantora, Kathleen Battle. Fiquei de imediato impactado. Primeiro por desconhecer ambas as cantoras famosíssimas ao que tudo indicava, e segundo pela potência vocal de Jessye Norman, uma das maiores do século XX como gostava de ressaltar o saudoso apresentador do “Quem tem medo da Música Clássica”, Artur da Távola. Impressionante, seria o termo correto. Norman impressiona pela grandeza da voz, pela imponência corporal, em suma pela atitude de Senhora do Canto. E me valho mais uma vez das palavras de Távola quando ele afirmou o quanto Jessye era penetrante ao interpretar as canções que ‘tocavam’ a sua alma e as origens negras. A isso chamo de verdade, é essencial aos grandes artistas serem verdadeiros consigo mesmos (não falo de verdade moral ou coisa do tipo), e Norman o é, certamente. Após esse primeiro contato com Jessye eu assisti outras apresentações dela em que interpretava óperas de Wagner, áreas de Bizet e até a Marselhesa na comemoração do 14 de Julho francês.
Anos se passaram e não é que agora Jessye “reapareceu” em minha vida?! Isso graças ao caro amigo Lucil que fez a benesse de presentear-me com o link que contem o álbum de Spirituals gravado por Norman. Exultei por poder ouvi-la novamente, e este período que quase invariavelmente é de uma melancolia persistente se tornou até mais... ou melhor menos deprimente. Enfim, não deixem de conhecer esta magnífica cantora, e antes de afirmarem categoricamente: “eu não gosto de música clássica” ouçam. Como diria um amigo “muitas vezes é a freqüência que determina o gosto”. Então é isso, se concedam o privilégio da dúvida, experimentem Jessye Norman! Até o próximo ano e bebam sem moderação...
(Este é o link para o álbum de Spirituals:
http://www.4shared.com/dir/3399445/c876f61c/Jessye_Norman_-_Spirituals.html )
Jean Carllo