domingo, 19 de abril de 2009

A arte de esquecer

Naquela mesa perto da parede onde o som da canção é mais baixo eles conversam. No palco os versos dizem que o amor foi eterno enquanto durou, mas chegou ao fim e na mesa o rapaz tenta convencer a amada que não é capaz de viver sem ela.

A moça sente que ele já não faz falta e por causa das boas lembranças procura uma maneira mais suave de convencer o ex-amor de que a relação chegou ao fim. No entanto ele não aceita. Chora, faz birra, diz que a ama. Fala da vida que perdeu o rumo e dos planos que só fazem sentido ao lado dela. A moça com o coração mole, defeito de fábrica do sexo feminino, acaba adiando a separação, mesmo sabendo que o rompimento é necessário.

O tempo evolui e o caso acaba. Ela revela que não quer compromisso e que precisa de tempo para cuidar de suas coisas. O rapaz, de novo, faz aquele drama. Relembra bons momentos, chora e fala sobre o caminho sem rumo e vazio sem a companhia da amada. Desta vez ela resiste e não sede ao choro do rapaz. Ela precisa seguir a vida por caminhos diferentes do dele.

A semana corre e o rapaz apaixonado continua telefonando, mandando flores, enviando torpedos e mensagens que contam o quanto ele está sofrendo com a separação.

A moça fica penalizada com tanto sofrimento e começa a imaginar se estaria trocando o único homem que pode fazê-la feliz por baladas e um pouco de liberdade. Começa a bater aquela duvida. A tristeza começa a fazer parceria com as barras de chocolate. A incerteza e a duvida rodando na cabeça corroem. Os dias caminham. A moça com um pouco mais de calorias e recuperada da crise emocional decide tentar outra vez.

Os dias que passaram não foram muitos. No máximo duas semanas. Ainda está em tempo de continuar. Porém, contudo, entretanto, todavia... O rapaz que ate a ultima terça-feira infernizava os momentos de lazer da garota com a ladainha de “amor eterno” parece já não amar. O discurso tão bem encenado de "não vivo sem você" parece terminado. A menos de três dias do ultimo “eu te amo” o garoto apaixonado já desfila com outro amor. As palavras de romantismo ditas a moça do cantinho do bar já foram transferidas à nova acompanhante.

O drama interpretado pelo rapaz virou comédia aos olhos da antiga moça. Ele a tirou o sossego. O sono. Do sério. Para no dia em que ela decide dar a tão implorada “nova chance” ele aparecer com um novo affer.

Os homens são surpreendentes. Amam, imploram, choram, enchem a cara e num abrir e fechar de olhos esquecem. Amor já não existe e eles estão mais que prontos para uma nova aventura.

E a antiga moça? Aquela que queria liberdade, mas deixou o amor que o rapaz dizia sentir por ela tocar o coração? Coitada! Se ela ainda não consertou o defeito de fábrica deve estar realizando uma nova e intensa sessão regada a tristeza e chocolate.

Por Janaina Takai
Foto: net

domingo, 12 de abril de 2009

A derradeira tentação


Há alguns anos mantenho o hábito de assistir ao filme A Última Tentação de Cristo no feriado da Semana Santa. Esse “assistir ritualístico” tornou-se para mim, agnóstico-ateu em constante crise, um importante contraponto ao catolicismo reinante, à pseudo-compaixão dos crentes em Cristo...

Opiniões religiosas à parte, não estou aqui para escrever sobre os aspectos teológicos do filme, embora sejam por demais interessantes. Penso apenas escrever sobre as características artísticas da Última Tentação – mas sei também que não sou apto para fazer análises intrincadas, estabelecer relações complexas, ou seja, aquilo que uma critica ou análise ‘séria’ deveria abordar. No entanto, reconhecido humildemente as minhas limitações interpretativas, quero aqui comentar duas ou três cenas que tornam este o melhor filme sobre a vida de Cristo e para mim especificamente um dos 3 melhores do diretor Martin Scorsese (os outros dois são: Taxi Driver e Touro Indomável).

Sem mais delongas vamos a algumas cenas. Logo de inicio, na cena em que “conhecemos” Jesus somos confrontados com toda uma série de pré-saberes, preconceitos e conceitos em nós incutidos, em grande parte, por obras de arte em consonância com os dogmas católicos. Ou seja, na apresentação de nossa personagem titulo conhecemos um homem atormentado, mesmo que ainda não explicitamente, por vozes internas. Ele trabalha sob a madeira, “um marceneiro...” é possível pensar instantaneamente em uma dedução mais do que correta. Contudo não um marceneiro de portas, mesas e outros objetos corriqueiros como normalmente assistimos em outros filmes. Aqui Jesus é um feitor de cruzes. Um colaborador indireto da opressão Romana, como Judas (isso o tal traidor, se você deduziu corretamente) afirma ao conhecer o proto-messias ainda nesta primeira cena.

É por ter essa perspectiva não usual e menos dogmática ao nos apresentar Jesus que considero essa cena de introdução uma das melhores do filme. Ali já temos toda a complexidade, o duelo entre a natureza divina e humana, o medo do desconhecido, em suma o emaranhado problemático que é o Filho do Homem.

Mais adiante temos uma cena clássica e de conhecimento geral: o Batismo de Jesus. A cena é clássica, mas mais uma vez a perspectiva adotada por Scorsese foge completamente do convencional. Antes de sabermos quem é João Batista (aquele que precederia o Messias) somos arrastados por um turbilhão rítmico de tambores, cantorias, pessoas em transe (algo semelhante aos cultos de religiões de matriz africana) e lá no meio do riozinho um homem de costas a fazer um discurso violento. Esse é João Batista, retratado mais velho e bem mais “selvagem” que o normal... Atentem para o dialogo que precede o famoso momento do “batismo”, é sem duvida muito bem articulado.

O que mais chama a atenção nesta cena: o estranhamento de assistir algo semelhante (músicas, gestos e atitudes) a um ritual pagão. Isso destoa do comunalmente plácido, singelo e insosso Batismo. Surpreendente, os religiosos fervorosos devem se sentir ultrajados...

Outra cena. Medrosamente após a entrada triunfal em Jerusalém e de expulsar os “vendilhões do Templo”, Jesus assustado pelo furor da população e pela presença de centuriões romanos foge auxiliado pelo seu melhor amigo Judas (isso o traidor!). Em meio a um grande conflito (o que até este momento representa apenas mais um) Jesus pede ao seu mais adorável discípulo e motivador para ser traído, apresentando para o chocado e futuro-simbólico-grande-traidor-da-humanidade (ode ao hífen!) argumentos convincentes para que tal ação seja realizada.

A cena nem é das mais brilhantes, mas a atuação de Harvey Keitel (Judas) na sua melhor durante todo o filme, e de Willem Dafoe (Cristo) vale como um dos pontos altos do filme.

E claro por fim – porém não menos importante, como se diz por aí –, destaco a cena que dá nome ao filme: A ultima tentação. Neste momento a grandeza do roteiro se impõe. O Jesus medroso, conflituoso e demasiadamente incerto sobre a personalidade divina – e em conseqüência da necessidade de ser oferecido como sacrifício – se revela. É o “lado” humano sobrepondo-se ao divino. O homem venceu o Deus. Mas até quando, questionamos. Acostumados com as idas e vindas da incessante dialética da personagem seria muito fácil aceita-la em paz... Quanto a isso a resposta não tarda.

Damos-nos conta afinal e ao final que Jesus sempre será um atormentado, o Cristo da última tentação é “de momentos” e estranhamente sazonal. Eis aí o grande mérito de Scorcese, transferir toda essa riqueza para uma história popularíssima, “a mais representada de todos os tempos”. Tentei fazer por aqui apontamentos, uma vez que seria por demais exaustivo comentar outras tantas cenas excelentes, com fotografias e trilhas em perfeita composição. Para aqueles que não assistiram A Última Tentação de Cristo vale fazê-lo o quanto antes, não espere a próxima Semana Santa. Ah, aliás, não entrei em nenhum momento neste post no que seria a última tentação, mas posso afirmar que O Código da Vinci é ainda mais simplório se comparado ao filme.



Jean Carllo

sábado, 4 de abril de 2009

Livro ou Sabedoria? Os Dois! Com Moderação e Respeito...

De Volta ao Mistureba!

Mais de 3 meses sem rabiscar por aqui. Pelas minhas contas, quase 100 dias que não posto nada neste blog. Tempo este que me custou um surto de desespero na hora de fazer o login, pois esqueci a senha e até onde deixei a bendita anotada. E como esquecer números é algo normalíssimo na minha vida, nem estressado fiquei como costumo ficar quando vou fazer algo e não dá certo. Quando isso é com números, eu dou é risada. Tamanha lerdeza que possuo com tal gênero. Pelo menos dessa vez tive sorte ao menos em chutar e conseguir acertar.

Vai ser algo meio pessoal, e não foi esta a proposta que criamos para o Mistureba. Mas só quero já justificar minha falta de criatividade nos últimos dias.

Não é crítica ou raiva. É simplesmente um momento onde não consigo entender os outros e muito menos a mim. Onde vejo que brigar por opinião é coisa para burro como eu, que nunca foi de ler muitos livros, principalmente livros que dizem ser aqueles que só inteligente lê. Mas se você ler um livro desse cabarito (cheio de conceito) e o entende, parabéns. Você tem “conceitos” e pode discutir. Se é como o humilde cidadão aqui. Esquece, você é jogado da conversa a ponta pés verbais. Porque nos livros, parece ter todas as razões do mundo. Então, opinião não é nada nessas condições.

Aprendi com o tempo esse lance de conviver com as pessoas, mesmo sendo filho único e tendo sobre mim o clichê de filho mimado. Minha mãe e meu pai sempre me “jogaram” para que isso não acontecesse. Desde 7 anos já me virava sozinho com almoço, lanche, janta também e o que fosse necessário para não ficar na colinha dos dois. E sempre me falavam e falam da importância de saber respeitar as pessoas. Sejam elas parecidas ou não comigo. E me ensinaram o quanto uma palavra pode fazer mal para uma pessoa. O quanto descontar a raiva nos outros para ficar bem, é uma coisa não agradável.

É aí que me pego em um quarto vazio, escuro, gelado e sem janela. Nos tempos atuais do meu cotidiano, talvez por “baixa alto estima” (ficou estranho), venho sentindo golpes dolorosos por isso. Quando comento algo, sempre levo cada cruzado na minha mente, que me dá vontade de largar tudo e ficar o resto da minha vida em uma biblioteca lendo todos os livros do mundo. Para ver se aprendo um pouco de conceitos teóricos. Pois ando percebendo que saber ou tentar ter um convívio estável e respeitar a opinião dos outros, é coisa para burrinho. E que teoria é sinal de inteligência. E que convivência não é nada. Você não precisa ter respeito, mas é necessário ter conceito.

Sendo assim, insisto na minha burrice. E digo aqui que respeito essa opinião de conceito, até porque é uma forma de se adquirir conhecimento. E eu tenho muita admiração para os adeptos desta forma de inteligência.

Mas, não adianta ler “trocentos” livros, e não ter a compreensão de entender os problemas que um colega passa em casa. Como aconteceu comigo. Se for para ofender as pessoas, chamá-las de incompetentes (interpretei desta forma), eu prefiro continuar sem teorias, sem conceitos e simplesmente ter a sensibilidade de dar o ombro para um amigo quando este estiver passando pelo que estou.

Termino com o verso da Marisa Monte na letra da canção Gentileza. E disponibilizo o link do clip e a letra completa, para que fique mais claro o que quis dizer.


“Por isso eu pergunto
A você no mundo
Se é mais inteligente
O livro ou a sabedoria”

Aqui o link do clip.
http://www.youtube.com/watch?v=VKnVAZHehV0


Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
A palavra no muro
Ficou coberta de tinta

Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
Só ficou no muro
Tristeza e tinta fresca

Nós que passamos apressados
Pelas ruas da cidade
Merecemos ler as letras
E as palavras de gentileza

Por isso eu pergunto
A você no mundo
Se é mais inteligente
O livro ou a sabedoria

O mundo é uma escola
A vida é o circo
Amor palavra que liberta
Já dizia o profeta



Vanildo Marley